16.11.04

Priiiii!

‘Dá-me seis gajos com bigode, três carecas, um comunista e um vesgo e eu faço-te campeão nacional’
Férenc 16:15

O futebol português já Não é o que era. Se falamos de futebol, ainda mais de futebol português, é imprescindível começarmos com um cliché. Como é que fazem os jogadores brasileiros mal aterram no aeroporto? Ãh? Podíamos utilizar outros, como o octaviano ‘com muito trabalho alcançaremos os nossos objectivos’, o solidário ‘temos um balneário muito unido’, o auto-moderador ‘temos que ser humildes e respeitar o nosso adversário’ ou até o subversivo ‘sabem que não costumo falar dos árbitros, mas...’, mas estes não vêm nada a propósito. Fiquemos com o saudosista ‘O futebol português já não é o que era ‘. A verdade é essa: O futebol português mudou. Não de um dia para o outro, Não de forma espontanea ou por artes mágicas. Nada é permanente, tudo se transforma. Menos Jaime Pacheco.

Não interessa se essa evoluçao foi para melhor ou para pior, isso deixamos para outros gajos. Não interessa se um campo com tartan é melhor ou pior que umas bancadas a poucos metros da baliza, se um estilo afro-disco-dos-suburbios do Minervino é mais sexualmente atraente que um estilo neo-Mohawk de Porfírio, se era mais beto o Bi-Bota (vénia) ou o Diogo, se devíamos manter por cá os nossos Jorge Leitões, Mamedes ou Rui Patacas como antes mantínhamos os nossos Luis Sauras, Crisantos ou Chicos Faria, se preferíamos um Rui Tovar ou um Daniel Bessa. Não estamos aqui para fazer juízos de valor, apesar de ainda termos fotos de Minervino dentro do guarda-fato (o poster do meio. E com o bigode aparadinho).

A verdade é que temos saudades. Temos saudades de ver jogos no peão ao domingo á tarde, do bigode de Vermelhinho, do romantismo de um Feirense que prefere manter a sua identidade lusitana a ganhar jogos, do tempo em que se vendiam garrafas de vidro nos estádios e os árbitros vestiam de preto, do bigode do Vermelhinho, do tempo em que as faltas por trás não levavam amarelo e os guarda-redes defendiam um atraso com as maos, do Bernardino Pedroto a treinar o V. Guimaraes e do bigode do Vermelhinho.

Temos saudades do tempo dos capitaes de aço, como Gregório Freixo, Ferreira da Costa ou Rui França, homens de nobre linhagem que impunham o seu carisma e comandavam as suas tropas, com a eloquência subtil de pastores brasileiros de uma qualquer igreja alternativa, exigindo, em cada domingo, a dízima ao seu rebanho.

Temos saudades quando tínhamos o privilégio de nos deixarmos inebriar pelo exotismo sedutor de uma legião estrangeira digna e meritória, heterogénea mas solidária, onde um Negrete ‘pontapé-de-moinho’ galantemente se enfrentava a um Amarildo ‘coiçe-de-mula’ e um Mladenov compartia o seu protagonismo de estrela internacional com um Mapuata, representando a universalidade do futebol portugues num mundo ainda não globalizado, separado por uma barreira que era muito mais que física.

Temos saudades do Espinho de Quinito, do Guimarães de Autuori, do Boavista de Raul Águas e do Belenenses de Marinho Peres. E de John Mortimore. Ai, John Mortimore... E do morcego-da-paz Octávio, o vigilante da noite, digníssimo Presidente dos Bombeiros Voluntários de Palmela.

Chamem-nos piegas, revivalistas, saudosistas e o caneco. Assumimos! Somos! Mas quem viveu uma apresentação do Eskilsson aos sócios e se não foi dos que se esvaiu em sangue após cortar os pulsos, sabe do que estamos a falar. A diferença entre o futebol português de há 15 anos é que antes os ídolos se chamavam Cabumba, Conhé, Bobó e Babá. Agora chamam-se Ricardo e Não Labreca, Beto e Não Severo, apenas Simao, já sem o Sabrosa. E quem se chama agora Tamagnini? Bem hajam Bodunha, Febras e Edú Brasil, seus incorruptíveis. Houve uma evolução no futebol português, sim. Mas uma evolução quase apenas cosmética mas que não se resumiu apenas ao nome dos jogadores. Cosmética. A substância manteve-se, ou piorou. A diferença entre o futebol português de há 15 anos e o de agora está na genuinidade. Perdeu-se quando se impôs a hipocrisia.

Apenas queremos voltar a uma época em que o futebol era mais puro e mais macho. Apenas queremos voltar a sentir esse encanto, lembrar esses momentos, homenagear esses ídolos e divagar sobre tantas particularidades que o fizeram (e, em alguns casos, ainda fazem- Obrigado Papa) tão sui generis. Nunca te esqueçeremos, Minervino.

Queremos fazer justiça e recordar um futebol português já esquecido, tantas vezes irreconhecido e muitas desprezado. Antes de mais para nós mesmos, para nosso prazer, como os putos caixeiros que preferem divertir-se em toques e fintas, ratas e bicicletas antes de deixar que os outros curtam também um cochinho. A verdade é que somos os donos da bola e só joga quem a gente quiser. E vai pá baliza quem for mais gordo.

E temos saudades do Festas e do Vivas. Mudós cinco, acabós dez. Começó jogo.


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